Por: Nestor W Neto
O uso de súmulas e jurisprudências é comum no meio jurídico e trabalhista. Elas têm sua função: orientar decisões judiciais, padronizar entendimentos e reduzir insegurança jurídica. Mas e na área de SST? Por que devemos evitar?
Porém, quando o assunto é saúde e segurança no trabalho, basear práticas de gestão em súmulas e jurisprudências pode gerar interpretações equivocadas, desatualizações e falhas graves na tomada de decisão.
A Súmula é criada quando uma alta corte, como o TST (Tribunal Superior do Trabalho) ou o STF (Supremo Tribunal Federal), identifica que vem julgando repetidamente casos semelhantes da mesma maneira. Para evitar decisões contraditórias e orientar o judiciário, o tribunal consolida esse entendimento em uma súmula, que passa a representar a interpretação oficial daquela corte sobre o tema.
SST é uma área técnica. Seu alicerce deve ser ciência, engenharia, fatores humanos, gestão de riscos e normas regulamentadoras. E é justamente por isso que o uso de súmulas e jurisprudências deve ser evitado.
Boa parte das Súmulas mais atrapalha do que ajudam a entender SST, por exemplo, a Súmula que aborda o adicional de insalubridade para quem limpa banheiros com grande circulação de pessoas, não diz nem o que seria “grande circulação de pessoas”.
Há uma Súmula que desconsidera o protetor auditivo na questão de atenuação do risco ruído, ignorando a metodologia usada que comprova a eficácia do protetor auditivo, ignorando a ciência, vários testes de atenuação de ruído feitos com centenas de pessoas envolvidas. Tudo isso porque algum ministro/juiz acredita que a opinião dele vale mais do que estudos, testes, cálculos, entidades (brasileiras e estrangeiras como a AIHA, por exemplo), e profissionais técnicos que validaram tudo isso.
A seguir, veja os principais motivos.
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Súmulas não acompanham a evolução técnica e científica da SST
Uma súmula pode ter sido formulada há dez, quinze ou até cinquenta anos, e não necessariamente reflete:
- Novas tecnologias.
- Estudos, testes, cálculos, probabilidades.
- Novos agentes.
- Novas metodologias de avaliação.
- Mudanças nas Normas Regulamentadoras.
- Evolução em fatores humanos.
- Conceitos modernos de cultura e gestão de riscos.
SST muda rápido.
A jurisprudência, não.
Um bom exemplo é o entendimento jurídico de insalubridade relacionado a alguns agentes químicos ou físicos, que muitas vezes se baseia em decisões antigas, sem considerar métodos atualizados de medição.
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Elas foram criadas para resolver conflitos jurídicos, e não para orientar gestão de riscos
A jurisprudência tem um papel:
➡ interpretar a lei.
Mas gestão de SST tem um papel totalmente diferente:
➡ prevenir eventos indesejados e proteger pessoas.
Ou seja: jurisprudência ajuda a resolver o passado.
SST precisa olhar para o futuro.
As Súmulas existem para guiar o trabalho do juiz, e não dos peritos, ou dos profissionais que precisam fazer gestão de riscos ocupacionais.
- Jurisprudência generaliza situações que, na prática, são totalmente específicas
Uma súmula pode dizer que determinado agente causa insalubridade em certa situação.
Mas ela não considera:
- Tempo de exposição.
- Intensidade real.
- Eficácia dos controles.
- Contexto operacional.
- Nível de proteção existente.
- Comportamento da atividade.
Na prática, cada empresa tem uma realidade, e a aplicação normativa precisa considerar esse fato.
Decisões generalistas podem levar a erros, tanto para mais quanto para menos.
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O risco de criar distorções na gestão de SST
Quando a empresa usa súmulas como fonte técnica, surgem distorções como:
- PGR ou LTCAT baseado em decisões judiciais, e não em análise técnica.
- Exposições mal classificadas.
- Controles inadequados.
- Ações corretivas desalinhadas da realidade operacional.
- Confusão entre “direito trabalhista” e “segurança operacional”.
Isso gera riscos reais — inclusive jurídicos.
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SST deve ser baseada em normas regulamentadoras, evidências técnicas e boas práticas internacionais
A base correta da área é:
- Normas Regulamentadoras atualizadas.
- NHO (Norma de Higiene Ocupacional).
- Boas práticas internacionais (ISO 45001, ILO, HFACS, ICMM, Energy Wheel, HOP),
- Engenharia,
- Limites de exposição nacionais ou internacionais (como os da AIHA, por exemplo).
- Gestão de riscos.
- Fatores humanos.
Essas fontes são vivas, revisáveis e alinhadas com a realidade operacional.
Conclusão
Súmulas e jurisprudências são ferramentas jurídicas importantes, mas não devem nortear a gestão de SST.
Elas servem para interpretar conflitos, não para orientar prevenção.
Para proteger pessoas, reduzir riscos e fortalecer a organização, precisamos de análises técnicas, evidências e boas práticas de gestão.
Um PGR, um LTCAT, uma avaliação ergonômica ou uma análise de risco jamais devem ser baseados em decisões jurídicas (até porque não há uniformidade de julgamento nem entre juízes), e sim naquilo que a ciência, a técnica e a legislação especializada determinam.
Empresas que entendem essa diferença tendem a fazer gestão mais eficiente, reduzir acidentes e evitar tanto passivos, quanto interpretações equivocadas.

